A ADOÇÃO DA LOGÍSTICA REVERSA NA EMPRESA E SEUS CRITÉRIOS LEGAIS

Ao ratificar os Pactos Internacionais da ONU para a preservação da Biodiversidade, o Brasil assumiu o cumprimento de diversas metas para o alcance da sustentabilidade. No mais recente assinado Pacto de Paris, a preocupação quanto à utilização responsável dos recursos naturais e o descarte dos produtos de que decorrem seus beneficiamentos tem aumentado significativamente.

A fim de regulamentar a gestão dos resíduos sólidos, o Brasil adiantou-se com a publicação da Lei n. 12.305/2010 e seu Decreto n. 7.404/2010, na implementação da Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), criação do Comitê Interministerial da Política Nacional de Resíduos Sólidos e o Comitê orientador para a Implantação dos Sistemas de Logística Reversa, instalando-se desde então um grande avanço para o desenvolvimento sustentável, pela mudança na realidade legislativa referente à gestão dos resíduos sólidos.

Citada legislação implementou uma nova concepção de consumo, instituindo a responsabilidade compartilhada, os acordos setoriais e o mecanismo da logística reversa, fundados no basilar princípio do poluidor-pagador como forma de internalizar as externalidades negativas geradas no processo produtivo através do retorno de produtos a sua base de origem, para o descarte ambientalmente adequado.

Embora a lei que instituiu a PNRS seja considerada recente, a sua aplicação prática é urgente quando se considera a realidade da escassez de recursos naturais no planeta. Além disso, o tema do desenvolvimento sustentável é realidade no Brasil.

Muitos fatores contribuem para práticas sustentáveis no ambiente empresarial e a regulamentação legal viabiliza que ferramentas de gestão de retorno de resíduos sejam aplicados, ganhando relevância a ferramenta denominada logística reversa.

A logística reversa consiste na ideia de que a vida de um produto não termina com sua entrega ao cliente. Esta ferramenta garante que os produtos vendidos sejam coletados, retornados e dispostos de forma a respeitar as políticas da empresa, acordos com clientes e a legislação pertinente.

O artigo 3o., inciso XII da Lei n. 12.305/2010 traz o conceito legal da logística reversa:
Art. 3o. […] XII – logística reversa: instrumento de desenvolvimento econômico e social caracterizado por um conjunto de ações, procedimentos e meios destinados a viabilizar a coleta e a restituição dos resíduos sólidos ao setor empresarial, para reaproveitamento, em seu ciclo ou em outros ciclos produtivos, ou outra destinação final ambientalmente adequada.

De igual forma, conceitua referido termo GUARNIERI: “[…] a logística reversa é um processo de planejamento, implementação e controle do fluxo dos resíduos de pós-consumo e pós-venda e seu fluxo de informação do ponto de consumo até o ponto de origem, com o objetivo de recuperar valor ou realizar um descarte adequado. Desta forma, contribuindo para a consolidação do conceito de sustentabilidade no ambiente empresarial, apoiada nos conceitos de desenvolvimento ambiental, social e econômico.” (Patrícia Guarnieri).

A autora ainda ressalta a importância da logística reversa para as empresas pois além de perfazer monta considerável se comparado com resíduos domiciliares, representa uma oportunidade de um retorno econômico para a empresa geradora.

Outro efeito positivo da logística reversa refere-se à sua atuação como um dos instrumentos para a efetivação concreta do direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado.

Alguns segmentos denominam este reaproveitamento dos resíduos de economia circular, no qual determina-se a possibilidade de criação de produtos de ciclos múltiplos de uso, circulando de forma eficiente, reduzindo a dependência em recursos ao mesmo tempo em que elimina o desperdício.

A Política Nacional de Resíduos Sólidos

A Lei da PNRS determina, em seu Artigo 33, que são obrigados a estruturar e implementar sistemas de logística reversa, mediante retorno dos produtos após o uso pelo consumidor, de forma independente do serviço público de limpeza urbana e de manejo dos resíduos sólidos, os fabricantes, importadores, distribuidores e comerciantes de agrotóxicos, pilhas e baterias, pneus, óleos lubrificantes, lâmpadas fluorescentes, de vapor de sódio e mercúrio e de luz mista e produtos eletroeletrônicos e seus componentes, vejamos:

Art. 33.  São obrigados a estruturar e implementar sistemas de logística reversa, mediante retorno dos produtos após o uso pelo consumidor, de forma independente do serviço público de limpeza urbana e de manejo dos resíduos sólidos, os fabricantes, importadores, distribuidores e comerciantes de:
I – agrotóxicos, seus resíduos e embalagens, assim como outros produtos cuja embalagem, após o uso, constitua resíduo perigoso, observadas as regras de gerenciamento de resíduos perigosos previstas em lei ou regulamento, em normas estabelecidas pelos órgãos do Sisnama, do SNVS e do Suasa, ou em normas técnicas;
II – pilhas e baterias;
III – pneus;
IV – óleos lubrificantes, seus resíduos e embalagens;
V – lâmpadas fluorescentes, de vapor de sódio e mercúrio e de luz mista;
VI – produtos eletroeletrônicos e seus componentes. 

Diante do que determina a legislação, a logística reversa é obrigatória apenas para seis cadeias produtivas, porém, com possibilidades de expansão para outros segmentos, a partir dos acordos setoriais, previstos também na mesma Lei, em seu artigo 3o., inciso I, “[…] acordo setorial: ato de natureza contratual firmado entre o poder público e fabricantes, importadores, distribuidores ou comerciantes, tendo em vista a implantação da responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida do produto”.

O primeiro acordo setorial assinado desde a sanção da Lei ocorreu em 19/12/2012 pela Ministra do Meio Ambiente Izabella Teixeira, destinado aos fabricantes, importadores, distribuidores ou comerciantes de Óleos lubrificantes embalados. Pelo acordo, as empresas do setor assumem uma responsabilidade compartilhada pelo recolhimento e destinação final dos resíduos de seus produtos.

Referidos acordos setoriais no Brasil podem ter abrangência nacional, regional, estadual ou municipal e são coordenados pelo Governo Federal através de chamamentos públicos, a exemplo do Chamamento o acordo setorial de logística reversa de medicamentos (Edital n° 02/2013). Mas os acordos setoriais podem partir do setor privado também, pela apresentação de proposta de logística reversa naquele setor, ratificado pelos seus representantes e apresentados formalmente ao Ministério do Meio Ambiente.

Outro instrumento de aplicação do sistema da logística reversa previsto na regulamentação da Lei de Resíduos Sólidos é o termo de compromisso, que poderá ser celebrado de igual forma entre os fabricantes e o Poder Público, mas difere do acordo setorial porque não possui natureza jurídica contratual e possui previsão para casos em que não existam outros instrumentos na área de abrangência.

O termo de compromisso possui força de título executivo extrajudicial, sendo altamente eficaz pois para sua instituição não é necessário passar por procedimentos judiciais, ao mesmo tempo em que, no caso do seu descumprimento, ele poderá ser executado diretamente perante o Poder Judiciário.

Entretanto, o termo de compromisso somente pode ser utilizado em situações específicas, tais como: a) no curso do inquérito civil; b) no curso de um procedimento administrativo; c) em procedimentos judiciais a que se refere a Lei 9.605/98, quando envolver infrações penais de menor potencial ofensivo; e no curso de ações judiciais.

Na prática, a utilização do termo de compromisso pressupõe um conflito preexistente, o que dificulta as ações de aproximação com o setor empresarial para uma mudança de comportamento. Por isso, uma via de implementar a logística reversa independente da obrigatoriedade legal, deve partir do estabelecimento de uma gestão pontual dos resíduos mediante a celebração de um termo de compromisso, o que deverá partir do setor privado, em vias de regulamentar e fazer valer os preceitos sustentáveis na empresa.

Envolvimento do Poder Público, Setor Empresarial e Coletividade

Segundo prevê o artigo 25 da Lei que instituiu a PNRS, “O poder público, o setor empresarial e a coletividade são responsáveis pela efetividade das ações voltadas para assegurar a observância da Política Nacional de Resíduos Sólidos e das diretrizes e demais determinações estabelecidas nesta Lei e em seu regulamento”.

Considerando-se a abrangência territorial dos acordos setoriais implementados, o Poder Público deverá estabelecer regras a ele correlacionadas. Portanto, é dever do Estado estabelecer sanções específicas para a disposição incorreta dos resíduos, assim como atuar na sua fiscalização.

O setor empresarial que fizer parte do acordo setorial, previamente estabelecido, estará sujeito às penalidades nele previstas, no caso do seu descumprimento, penalidades estas igualmente previstas no acordo setorial.

E a coletividade também possui importante papel na gestão dos resíduos, após a implementação da logística reversa nos determinados setores, sendo responsável pelos atos de reciclagem, reuso e reaproveitamento de material.

Proibições e Penalidades

A Lei que dispõe sobre a gestão de resíduos sólidos e implementa a PNRS reforça proibições de destinação de resíduos em seu artigo 47, assim como já é previsto na Lei de Crimes Ambientais (Lei no 9.605, de 12 de fevereiro de 1998), atribuindo a pena de detenção de um a três anos mais pagamento de multa.

Art. 47.  São proibidas as seguintes formas de destinação ou disposição final de resíduos sólidos ou rejeitos:
I – lançamento em praias, no mar ou em quaisquer corpos hídricos;
II – lançamento in natura a céu aberto, excetuados os resíduos de mineração;
III – queima a céu aberto ou em recipientes, instalações e equipamentos não licenciados para essa finalidade;
IV – outras formas vedadas pelo poder público. 

Importa ressaltar que a queima de resíduos sólidos e rejeitos de igual forma é vedada ao empresário, eis que esta opção polui o meio ambiente com a emissão de gases na atmosfera, gerando poluição na mesma escala.

Os artigos 51 e 52 da Lei que institui a PNRS prevêem a responsabilidade na reparação dos danos caudados por pessoa física ou jurídica, por ação ou omissão, na inobservância da Lei, citando que as condutas e atividades lesivas ao meio ambiente serão penalisadas com sanções penais e administrativas previstas na citada Lei de Crimes Ambientais.
O artigo 53 da Lei da PNRS altera o § 1o do artigo 56 da Lei de Crimes Ambientais, o qual passou a vigorar com a seguinte redação:

“Art. 56
§ 1o  Nas mesmas penas incorre quem:
I – abandona os produtos ou substâncias referidos no caput ou os utiliza em desacordo com as normas ambientais ou de segurança;
II – manipula, acondiciona, armazena, coleta, transporta, reutiliza, recicla ou dá destinação final a resíduos perigosos de forma diversa da estabelecida em lei ou regulamento.

Portanto, em paralelo às sansões administrativas instituídas nos acordos setoriais, o setor empresarial está sujeito às sanções previstas na Lei de Crimes Ambientais, as quais são aplicáveis à pessoa física ou jurídica, com sansões previstas de reclusão, detenção, multas, advertências, suspensão das atividades ou suspensão de venda ou fabricação dos produtos.

Cabe assim ao empresário adequar-se à legislação, manter-se atento às novidades implementadas em Lei, acordos setoriais e termos ratificados pelos órgãos de classe, de modo a prevenir-se de surpresas nas fiscalizações ambientais. Neste aspecto a adoção da logística reversa no âmbito empresarial demonstra a preocupação da empresa na preservação do ecossistema e dos recursos naturais, assim como afasta o risco de ser penalizado pela omissão quanto ao desenvolvimento de um sistema adequado de destinação de seus resíduos.

O Importante papel do Empresário na instituição da Logística Reversa

A implementação do sistema de logística reversa na empresa, independente da preexistência de acordo setorial que obrigue o setor, beneficia o empresário e a sociedade, pois o empresário que possui a visão de preservação dos recursos naturais, instituindo programas auto sustentáveis dentro da empresa, somando-se ao sistema da logística reversa, gera reflexos positivos em sua imagem à sociedade assim como internamente, melhorando a qualidade de vida no ambiente de trabalho.

O papel do empresário de estabelecer diretrizes de novos padrões de consumo e produção, envolvendo a sociedade no desenvimento do programa, gera a longo prazo uma mudança cultural. Este passo à mudança da cultura é orientada pela redução e reaproveitamento de resíduos com a condução de negócios inclusivos, refletindo na promoção de cidadania com reinserção social e em conjunto com a obrigatoriedade dos consumidores finais, de seguirem as regras estabelecidas sobre coleta seletiva e retorno adequado dos resíduos.

Cyntia Brandalize Fendrich OAB/PR 39.381
Luciana Maria Negrão Gandra Andreguetto OAB/PR 63.595
Samir Braz Abdalla OAB/PR 31.374

1 GUARNIERI, Patricia. Logística Reversa. Em busca do equilíbrio econômico e ambiental. 1 ed. Editora Clube de Autores, Recife: 2011. p.23.

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